terça-feira, 11 de janeiro de 2011

TP V: BLACKFOOT - Marauder

Embora sejam, de génese, uma banda southern rock, os Blackfoot atingiram o período mais meritório durante a sua fase mais hard rock. Esse é um dos enigmas por trás do veterano grupo de Jacksonville. O outro, reside no facto de terem sido mais bem sucedidos nesta altura na Europa que nos Estados Unidos, ainda para mais, encorpando alguma da iconografia musical americana mais típica. Residirá, justamente aí, o charme sedutor para ouvidos rock vibrantes com o el dorado setentista, coisa que já não era novidade para um auditório que tinha uns Lynyrd Skynyrd e outros que tais? Talvez.

Com quatro álbuns gravados, a banda já tinha o seu espaço nos States sulistas, mas a verdade é que, quando em 1981 é editado “Marauder”, não foi criado um especial impacto. E, se cá por terras europeias, o quinto disco dos Blackfoot gerava focos de entusiasmo e descoberta, era também o tempo de todos os booms e o “disco da águia” acaba por se diluir no tempo. Sem nunca ser esquecido, redescoberto entre o pó dos vinis mais preciosos, ou por este ou aquele músico que aí fundou raízes inspirativas. Tal como hoje, quando o rock duro sem tempo se permite vergar à teimosa memória dos primeiros dias. «Marauder» culmina o período mais forte e inspirado dos Blackfoot, depois de “Strikes” de 1979 e de “Tomcattin’” de 1980. Ao réptil e ao felino, sucede a ave de rapina na imponência orgânica simbolizada na imagética da altura, talvez não a mais genial em termos de artwork, mas de excelência artística, mal as espiras começam a rodopiar. Exactamente como sucede em “Good Morning”. Prenúncio de algo mágico, ao longe a distorção de Ricky Medlocke dá as boas vindas a uns Blackfoot no auge da sua sensatez, num dos temas mais ritmados do grupo, ainda hoje, enfatizado numa das suas peças mais reconhecíveis. No lado oposto da energia está “Diary Of A Workingman”, canção de serenas melancolias acústicas, para desembocar em intensidades que nos transportam para uma qualquer América proletária do século passado.

É destas alternâncias de estados de espírito e ambivalência de cores naturais que se compõe um álbum como “Marauder”, tal qual representação da paleta de possibilidades na Florida, onde o sangue índio sempre correu. Aqui é bem latejante, com três nativos americanos como Medlocke, o baixista Greg T. Walker e o baterista Jackson Spires, este último, falecido em 2005, vítima de aneurisma. Neto de Shorty Medlocke – que ouvimos em registo true redneck no início de “Rattlesnake Rock ‘N’ Roller” –, figura referencial no bluegrass de há muitas décadas, Ricky Medlocke sempre fora a alma dos Blackfoot, mas a partir do momento em que o line-up original se desintegraria (1985), o grupo deixa de expelir aquele elan especial, ainda que se mantenha hoje activo, com Walker a hastear a bandeira de uma banda fundada há quase 40 anos. Oscilando entre os momentos mais calmos e a impulsividade própria do Sul, “Marauder” é daqueles discos que amadurecem bem com o tempo, tendo em “Searchin’” outra pérola de dramatismo contemplativo e em “Fire Of The Dragon”, novo fogo ardente, da chama que uma banda destas pode ainda hoje manter, se estivermos dispostos a uma boa sessão de southern rock.

Daqui para a frente já nada foi igual. Ken Hensley dos Uriah Heep entra para os teclados e o consequente álbum “Siogo” assinalaria uma demarcação para sonoridades mais radio-friendly. É, portanto, a meio da carreira que está a virtude, com “Marauder” a fazer os Blackfoot soarem hoje a um autêntico “pata negra”, entre o que de melhor se fez no estilo, no início dos anos ’80.

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