quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

TP IV: BELIEVER - Dimensions

Muitas vezes, exasperamos pelas razões que levam determinada banda a cessar funções. É-nos difícil aceitar que tenham findado após “aquele álbum” excepcional, quase perfeito. É precisamente na obtenção desse máximo desígnio musical que reside o fim de operações; já não há estímulo para ir mais além.

Poucos meses após o lançamento de “Dimensions”, os norte-americanos Believer compreenderam que não haveria muito mais caminho a trilhar no seu thrash progressivo, de ramificações clássicas e pioneirismo operático no metal. São múltiplas e distintas as variações estilísticas deste terceiro álbum do grupo, mas só uma audição no seu todo fornecerá uma ideia da singularidade deste trabalho no espectro musical, inclusive na própria discografia dos Believer. A banda da Pensilvânia começou por se notabilizar na estreia de 1989, “Extract From Reality”, ao sugerir outras dimensões ao thrash da Bay Area, roçando laivos de death metal e arriscando tecnicismos pouco comuns na altura, mas é com “Sanity Obscure” que dá nas vistas, a sério. Três anos depois, “Dimensions” surge como um álbum à parte. A raiz thrash fundamenta a base criativa destes 52 minutos, mas sobre ela assentam muitas camadas que nada têm a ver com o estilo e que, em conjunto, perfazem aquele composto especial que forte impacto causou na altura (nem tanto assim, senão não seria um Tesourinho) e que, quinze anos depois, se mantém proeminente.

A verdadeira pérola deste trabalho está em “Trilogy Of Knowledge”, uma sequência de quatro peças em vinte minutos, num exercício de música erudita com metal, pouco visto até aos dias de hoje. Os instrumentos de cordas operam num registo minimal/progressivo de notável envolvência, imiscuídos da sedutora soprano que é Julianne Laird, bem antes de todos os Nightwishs que se seguiram. Em mágica sobreposição, a voz ríspida de Kurt Bachman, uma espécie de John Tardy mais ligeiro, a assentar que nem uma luva e de belo efeito aestético. O guitarrista/vocalista é a alma dos Believer, mas neste disco em que funcionaram como trio, não esquecer a notável bateria de Joey Daub e, mais ainda, o providencial baixo tocado por Jim Winters. A intro e os três movimentos da “Trilogy Of Knowledge” constituem apenas a parte finaldo álbum, que principia com um sinistro “Gone” e que tem pelo meio a serenidade pulsante de “Dimentia” e o thrash metal (quase) puro de “Singularity”. Quanto à filiação religiosa da banda, não é nada que importe muito para o fascínio artístico aqui obtido. Se a trilogia de fecho versa sobre a história de Cristo, outras letras há por aqui que evocam filósofos como Sartre ou Freud, sendo o álbum um ensaio sobre o modo como a ciência tomou conta do mundo.

Pela própria abertura estilística na música que concebem, os Believer serão uns crentes não dogmáticos e estranho não será o facto de Bachman ter hoje como via profissional a bio-medicina. Explorando igualmente estados de mente mais ou menos senis, este álbum surge salpicado de soundbytes de filmes como “O Exorcista III” ou “Hellraiser II” que, a par de outros sons samplados pela banda em estúdio, gera um efeito psicótico... quanto mais não seja, pela obsessão de o voltarmos a ouvir mais uma vez. E mais uma vez. As harmonias de guitarras também são qualquer coisa de magistral, guiando as estruturas próprias deste álbum para direcções de imprevisível deleite. Apesar de ainda algo obscuro, este álbum foi recentemente reeditado e os Believer tiveram a bela ideia de reunir a banda para o álbum «Gabriel», lançado em 2009. Razões mais que propensas para que, quem não as conhece, entre nestas dimensões. Acreditem.

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