domingo, 21 de novembro de 2010

TP III: SANCTUARY - Refuge Denied

Por vezes, há pequenos acontecimentos ou situações que nos levam a soprar o pó dos escaparates, para vermos se “ele” ainda lá está. E fazemo-lo inconscientemente, quase como se a memória tivesse dedos com vontade própria. Claro que está. Os tesourinhos estão sempre bem guardados.

Viagens no tempo num disco rígido mental movido a espiras, sem espaço (senão utópico) para .mp3; viagens suscitadas por happenings tão triviais quanto o ressurgimento do thrash metal - um disco 'novo' de Nevermore a sair em breve, alguém que recorda essa grande versão de Jefferson Airplane… Quase sem darmos por isso, o cobalto de "Refuge Denied" cobre-nos as mãos. E já não é a primeira, nem a segunda vez, este mês. O debutante dos dois álbuns dos Sanctuary impôs-se como um dos melhores trabalhos de peso intenso no final do profícuo ano de 1987 colocando, desde logo, os olhos e ouvidos do mundo heavy/power em Seattle que já gerara colossos (na altura) como Queensrÿche ou Metal Church.

Para muitos, este período da vida musical de Warrel Dane e Jim Sheppard constitui “apenas” os primórdios de Nevermore, mas o quinteto – e, sobretudo, este magnífico álbum de estreia – são muito mais que isso. É aqui que consta um dos melhores temas de sempre (não é exagero) do metal enérgico, "Battle Angels", cuja voz de Dane começa logo por se impor como qualquer coisa “do outro mundo”. O refrão “You’ll all fall on your knees” ecoa, ainda hoje, como um perpétuo grito de guerra, assim como entronizado parece um álbum como "Refuge Denied", tais são os argumentos nesta produção de Dave Mustaine que descobrira a banda, rendido que ficou a uma demo por eles entregue. Warrel Dane nunca mais cantou assim, só a espaços no sucessor "Into The Mirror Black" e muito parcamente em Nevermore, adoptando tons mais graves, sugeridos no tema de fecho deste álbum, "Veil Of Disguise". Além disso, e como tem vindo a desenvolver magistralmente até hoje, as suas letras são muito mais que versos para estender voz; são de uma profundidade notável, com especial brilhantismo em "Ascension To Destiny".

Com elementos de heavy metal num registo vocal que ainda transporta muita inspiração de Rob Halford, a primeira colecção de material dos Sanctuary pertence aquela gloriosa fornada de US power metal em meados da década de ’80, onde já despontava uma urgência thrash, aqui mais notória num tema como "Termination Force". Do lado sinistramente melódico temos "Die For My Sins" e essa soberba versão de "White Rabbit", com direito a carismática intro do próprio Mustaine. O som dos Sanctuary – e, consequentemente, dos Nevermore – sempre teve uma ligação umbilical com uma certa obscuridade melancólica, que pode ser enfatizada num tema como "Sanctuary". Jim Sheppard que, embora muitos não saibam, fora o primeiro baixista dos Alice In Chains, também deixa, desde logo, a sua marca de consistência rítmica envolvente nesta que foi a primeira de muitas experiências de estúdio em parceria com Warrel, até hoje. O compositor da maioria das faixas é Lenny Rutledge que, com Sean Blosl, formava a criativa dupla de guitarristas, ainda assim, inferior ao espantoso Jeff Loomis, que viria a completar a derradeira formação dos Sanctuary, em 1991.

Ao lote de notáveis que começa em Dave Mustaine – embora a sua opaca produção não esteja entre os principais méritos deste álbum – junta-se Ed Repka, artista icónico de um traço próprio que viria a aprimorar mais tarde e um engenheiro de som que dava pelo nome de… Terry Date. Personagens de uma história que faz parte da história do metal americano. E um disco que consta do santuário dos mais veneráveis.

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